Aquelas brincadeiras sensuais com Marina e todas as outras, na minha infância e adolescência — eu nem conto. Talvez um dia, vinte anos depois da minha morte, quem sabe... Também não levo em consideração todas as transas adolescentes porque porque lhes faltava um toque de sublime. Eram mais exercícios sexuais entusiasmados do que paixões enlouquecidas.
Então, explorando nossos mútuos segredos, tomamos o restinho do Martini branco em dois copos de vidro, eu e Beatriz. Para o poeta, isso equivale a um Veuve Cliquot em duas taças de Cristal. Fizemos amor como se transássemos, e não me lembro bem como. Na teoria, eu era um grande amante, mas não devia ter muita prática. Há nuvens na memória quanto a isso. Dormimos juntos, na mesma cama, de uma forma que Milan Kundera jamais teria recomendado.
Dia seguinte, domingo de Páscoa, quando acordei, ainda de bruços, olhei para o azul do lençol limpo, perfumado. (Por isso a fixação em lençóis azuis). Certifiquei-me de que era eu mesmo, e me virei. O teto — o próprio teto do mundo, pintado por Michelangelo, Episódios da Criação dançando no meu cérebro inquieto. Na parede à minha frente o Sagrado Coração — e Jesus, cabeça inclinada, a palma das mãos para cima, me olhava, sorrindo. (Foi a primeira vez que vi Jesus como um cara legal). À minha direita, a janela grande, sem cortinas, por onde o claro e o óbvio me enchiam de luz. À esquerda, a porta aberta e a música dos Beatles (qual?) entrando por ela. — Nenhuma pressa.
Me senti espreguiçando na própria Capela Sistina...
Que diferença da pensão onde eu morava...
(Fui morar nessa pensão na Rua Barão de Duprat porque eu queria vencer sozinho na vida, sem ajuda do meu Pai. E venci — mas esta é outra história!)
Uma toalha felpuda, branca, macia, cheirosa, ao meu lado, na cama. Levanto-me, enrolo-me, saio, quase caio. A mesa estava posta: era feijoada, feita-me por meu amor para o nosso amor.
(...)
Por falar em toalha felpuda, eu me lembro da toalha que minhas irmãs (Eloisa e Eliane) me deram naquele dia em que fui visitar minha Mãe. Era uma toalha feia, ressecada, encardida, azul desbotado, com a marca da Santa Casa de Misericórdia de Itapeva. Mas essa também é outra história...