22.4.20

Meus irmãos

Nenhum dos meus irmãos me compreende. Primogênito, solteiro e sem filhos, amante do vinho, da dança e da música — além de poeta libertário cheio de amores — pareço-lhes um louco.

Aliás, a partir do momento em que disserem que me compreendem, estarão eles assumindo, implicitamente, que se foderam. E essa conclusão, sob todos os bons pontos de vista, é-lhes desesperadamente incômoda. Porque nossas razões ainda são mutuamente excludentes. Com exceção de dois deles (cujas relações parecem até razoáveis, ainda que sem brilho), todos os meus irmãos se deram mal no casamento.

Todos.

Não dá nem pra disfarçar.

Logo vemos na cara dos coitados: se foderam no grau máximo que a expressão comporta.

Eu vivia lhes dizendo, e o demonstrava com minhas atitudes cotidianas:

— Não confundam uma transa eventual com a constituição de uma família. Não pensem que toda relação tem, necessariamente, que gerar uma fruta. Não se fodam em nome de nada, nem mesmo do amor. As relações são passageiras. Tudo se transforma. Não existe amor eterno...

Eu vivia lhes dizendo tudo isso — por anos e anos a fio — mas eles fizeram questão de não me ouvir.

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