2.12.09

meu reino por uma bic

Antes de abrir os olhos, a coisa que mais procuro quando me acordo é caneta. Abro as gavetinhas do criado mudo, e nada de caneta. As idéias, loucas, vazando pelos buracos da cabeça, sons entusiasmantes saindo por minha boca, como se Deus babasse delícias num colo de mãe.
Balbucio lembranças.
Meu reino por uma bic — eu daria. Meu cavalo por uma caneta. Parece uma loucura esse delicado desespero galopante, espiral de palavras em que me escrevo, líquido. Tremulo nas curvas ascendentes da poesia que dança sobre mim. São velozes as metáforas que agora me cavalgam, e negra é a sela voadora em que me prendo todo para tornar-me ainda mais livre.
Em minhas mãos, as rédeas loucas do meu destino.
Nada mais resta, a não ser o que virá...
Penso em Joyce, como se me ligasse ao desejo.
O futuro é agora o meu arreio — não há freio em minha boca.
A liberdade já começa a ter um nome.
Tambores from Destination Anywhere, a voz de Jon Bon Jovi é que martela essa bigorna selvagem que trago no peito.
A paixão é avassaladora, em todos os sentidos.
Acho que procuro me perder outra vez.
Não há promessas no que digo, mas Nietzsche me abre agora o seu portão, como se me abrisse um livro, na página eu.
E me diz, assumindo Zaratustra:
Gehen Sie, Mahatma!
Como também não há promessas no que ouço, vou buscar o que procuro às dez horas desta noite que amanhece tanto.
— De olhos fechados.

E se não vier a lua, não importa: virá o luar do mesmo jeito.
Meu peito não tem limite.
Sou feito de luz!