6.6.23

Circo ou matadouro —

A vida é um circo. Mas do lado de cá, temos um palco; do outro lado, um matadouro. No matadouro, as pessoas sérias representam. No palco, só tem palhaço. Os sérios são geralmente os "responsáveis", e formam um rebanho: mansos que caminham tristemente em direção ao nada. E riem dos palhaços. Estes, por sua vez, são inconsequentes, e riem da seriedade. Mas com uma diferença fundamental: além de rir dos sérios, os palhaços riem de si mesmos — e este é o ponto. Quem consegue rir de si, se salva. Quem só ri do outro, se perde, em todos os sentidos. Nos palcos e nos matadouros da vida, todos representam: os sérios e os palhaços — mas só os palhaços têm consciência disso.

Todos nascemos para a Arte, para o inocente jogo da Vida, para o lúdico, para o puro e o sorridente. Alguns permanecem no palco — e se transformam em artistas, atores, cantores, poetas, bailarinos, amantes, loucos: todos palhaços. Outros, convencidos à força pelos pais, pelos padres, pastores, professores e patrões — e, quando não, pela polícia — ficam sérios, perdem a graça e o brilho. E logo são encaminhados ao matadouro. Alguns, entretanto, retornam ao palco, depois de perceber que foram iludidos na origem: não lhes agradam os grilhões da seriedade: suas almas de palhaço ainda estavam intactas, por sorte.

Porque assim que você sai do ovo, algemas claras prateadas lhe são postas nos pulsos. Grilhões de seriedade nas canelas. Se você não reagir a tempo, teremos uma deusa enclausurada. Ou um pequeno deus encarcerado.

E eu fico pensando:

Qual será o perverso mecanismo que transforma esse Jesus num chefe de escritório? Que maldição faz da musa uma dona de casa? Quais são os fatores horrorosos que acabam levando um pequeno Buda em direção ao matadouro? O que é que, na maioria das vezes, arrasta um ser humano iluminado, e o joga no rodamoinho da desgraça cotidiana — e lhe apaga a luz?