13.9.22

Salmo 77

Filosoficamente, sou ateu — e nem poderia ser diferente. Afinal, estudei Filosofia na USP. Contudo, antes de ser ateu, sou poeta. Por isso, quando converso com minha Mãe sobre esse assunto polêmico, demonstro um respeito absoluto pelo Deus em que ela crê. Por exemplo, ontem ela ligou-me para, entre outras coisas, sugerir que eu lesse o Salmo 77:
Às vezes temos que ralhar com Deus — ela me conta.
Gostei desse modo novo de falar com Deus.
E resolvo brincar com ela:
— Esse salmo eu sei de cor, Mãe...
— Sabe nada — ela duvida de mim.
— Sei sim... Quer ver?

Salmo 77:
Às vezes temos que ralhar com Deus. Fazê-lo encostar seus ouvidos em nossa boca para que ouça bem o que temos a lhe dizer. Quando o Velho Caduco se faz de surdo, temos que gritar com Ele. Quando Deus cochila, temos que acordá-lo aos berros!



— Mas na minha Bíblia tá um pouco diferente... — ela me contesta, delicada e quase gargalhando.


E me abençoa de novo.

Para sempre.





Eu e minha Mãe nunca brigamos. Nunca!