4.2.15

pico de mim mesmo

Sou livre. Por isso, nada mais é necessário porque nada é tão preciso. Não existe mais busca, não há posse no território que habito a partir de mim mesmo. Nada tenho que eu possa perder, nada existe que eu queira ganhar. Produto do meu próprio trigo, gume da minha própria faca, sou o verso da minha poesia, e a fantasia de um espírito em repouso. Meu movimento, meu ócio, meu verbo, meu Deus. Minha pátria, minha religião, meu partido, meu clã. Sou a saudade e a ausência de suspiros, a sorte que sustenta-me o corpo, sonho enlouquecido da minha alma, porta que se abre sobre si, a paisagem, a luz — e o olho. Sou a morte do ontem, e a Vida que chega. E que basta, naturalmente. Como nada existe além do que eu perceba, nada mais preciso que a incerteza que se torna necessária. Nada me interessa além do que me toca o coração. Nada mais profundo do que ser só o máximo do mínimo. Nada mais gostoso do que a própria gostosura, nada mais humano que a divina alma desejante, saciada por ter sido, e estar sendo, ela mesma — e nada mais. Então, nada me falta e nada me sobra: sou a exata medida de todas as coisas, um conjunto pleno de vazio e de amor, mestre discípulo de Mim, um barco sem destino navegando numa breve eternidade — um verdadeiro Himalaia de razões.
Sou portanto o Pico de mim mesmo.
Nada mais.