10.8.14

meu pai

Ele era racional demais, disciplinado demais, e ético demais. Dominava o cálculo, era íntimo dos números, ensinou-me a tabuada do 13 quando eu tinha sete anos. Quem não sabe a tabuada se fode, ele me dizia. Nasceu para o comando. (...) Exagerado, tinha seus momentos de loucura: de vez em quando mandava fazer almoços festivos para crianças pobres. Era comum se reunirem duzentas ou trezentas em nosso restaurante. Ele nunca nos disse que gostava de poesia, mas certa vez mandou que plantassem trezentos e sessenta pés de girassol no fundo do quintal da nossa casa. Depois que as plantas cresceram, ele ficava toda tarde um tempão lá no fundo, sentado num banquinho improvisado de madeira, sorrindo, encantado, tomando vinho vermelho — e olhando os girassóis girarem... Meu pai, portanto — e no fundo — talvez não fosse só um simples comerciante... Talvez fosse um poeta. Pena que não teve tempo de ficar completamente louco: morreu aos 49, por erro de um médico que tinha a morte até no nome.