Março de 2001, Guarujá. Noite alta. Releio a belíssima biografia de James Joyce, escrita por Richard Ellmann. Joyce Ann lá fora no terraço vendo a lua, e Paritosh deitado aqui no chão, entretido com a história de Abraão puxando a faca para seu filho Isaac, contada de várias formas por Kierkegaard. Aliás, o Alcorão diz que foi Ismael, e não Isaac, o filho que Abraão levou à montanha de Morija para ser sacrificado.
Lembro-me de um grande amor que tive um dia, e que depois sumiu. Adna Mattos Gurgel. “Quase todos morrem...” — Vou à cozinha pensando em tomar um vinho, porém trago dois copos de leite.
Ofereço-lhe um, como se fosse uma flor.
— Paritosh, vou colocar um poema teu no livro Solidão a Mil?
Ele interrompe a leitura, atencioso para comigo.
— Qual?
— Aquele do amor que morre e do amor que acaba.
— Ah, mas já o escrevi há tanto tempo... Fosse hoje mudaria muita coisa. Ainda não te contei, mas estou escrevendo um ensaio com o seguinte tema: só amamos quem satisfaz algumas das nossas expectativas. O amor viceja na esperança: finda esta, morto aquele.
— Você acha que todo amor termina em morte ou sumiço? — pergunto.
— Sim, mas é melhor que seja por sumiço. Amor que morre é um horror, nunca morre de vez. Vai morrendo pouco a pouco: é um saco. Vai minguando, definhando, secando. Fica no meio da gente, ali no meio da sala, como visita indesejável, uma doença incurável, um catombinho. Um sintoma.
Começo a rir (seriamente) do que diz Paritosh.
“Tenho que abrir esta obra, fazer eco com ela.” — penso.
E ele continua, mais existencialista do que Sartre.
— Esse amor doente fica ali, na relação, meio desengonçado, perambulando, tossindo, enrolado num cobertorzinho. E você sabe qual o único aliado desse pobre diabo? O tédio. Só o tédio é que dá uma espécie de sobrevida ao amor que está morrendo.
— Mas o tédio não vem só depois que o amor morre? — resolvo provocar.
— Nada disso, meu caro: o tédio é o principal assistente do amor que agoniza. O tédio é o elemento central que tenta inutilmente prolongar a vida do desgraçado que falece.
— Bela teoria — tenho que concordar.
(...)
Continua.
Se quiser ler a página toda, dê um click aqui.
Se quiser saber quem é Paritosh, aqui.
Lembro-me de um grande amor que tive um dia, e que depois sumiu. Adna Mattos Gurgel. “Quase todos morrem...” — Vou à cozinha pensando em tomar um vinho, porém trago dois copos de leite.
Ofereço-lhe um, como se fosse uma flor.
— Paritosh, vou colocar um poema teu no livro Solidão a Mil?
Ele interrompe a leitura, atencioso para comigo.
— Qual?
— Aquele do amor que morre e do amor que acaba.
— Ah, mas já o escrevi há tanto tempo... Fosse hoje mudaria muita coisa. Ainda não te contei, mas estou escrevendo um ensaio com o seguinte tema: só amamos quem satisfaz algumas das nossas expectativas. O amor viceja na esperança: finda esta, morto aquele.
— Você acha que todo amor termina em morte ou sumiço? — pergunto.
— Sim, mas é melhor que seja por sumiço. Amor que morre é um horror, nunca morre de vez. Vai morrendo pouco a pouco: é um saco. Vai minguando, definhando, secando. Fica no meio da gente, ali no meio da sala, como visita indesejável, uma doença incurável, um catombinho. Um sintoma.
Começo a rir (seriamente) do que diz Paritosh.
“Tenho que abrir esta obra, fazer eco com ela.” — penso.
E ele continua, mais existencialista do que Sartre.
— Esse amor doente fica ali, na relação, meio desengonçado, perambulando, tossindo, enrolado num cobertorzinho. E você sabe qual o único aliado desse pobre diabo? O tédio. Só o tédio é que dá uma espécie de sobrevida ao amor que está morrendo.
— Mas o tédio não vem só depois que o amor morre? — resolvo provocar.
— Nada disso, meu caro: o tédio é o principal assistente do amor que agoniza. O tédio é o elemento central que tenta inutilmente prolongar a vida do desgraçado que falece.
— Bela teoria — tenho que concordar.
(...)
Continua.
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